
Uma arte rica
Viajando pela Índia sempre me surpreendi não só com a riqueza da arte indiana. Aquela dos antigos monumentos, templos, mesquitas, esculturas e pinturas. Igualmente me interessei pela produção artística contemporânea do país. Ela é rica no domínio das esculturas em madeira, marfim ou metal, ou pinturas sobre tecido ou papel. Algumas noções dessa arte são, porém, necessárias para melhor compreendê-la.

Pinturas indianas
A arte tradicional não assinada
Em primeiro, o fato de a arte tradicional, independente de sua origem religiosa, não ser assinada. Ou melhor, somente por artistas de influência europeia, que assinam suas obras. Aliás, os artistas indianos que têm ido estudar arte em Londres ou Paris adotaram um estilo ocidental de pintura. Muitos, entretanto conservam uma inspiração oriental mais particularmente indiana. Dessa forma, retratam figuras bastante sensuais, mas sem nada a ver com a arte tradicional.

Isso ocorre na arte clássica porque, às vezes, produzem uma obra em equipe, sendo um artista especializado em formas e outro em cores, por exemplo. A principal razão, porém, é religiosa: a arte é um dom Deus. Ou seja, o artista é apenas a fonte de onde brota a inspiração divina. O artista passa, portanto a se tornar apenas o instrumento da criação divina e assinar sua arte seria quase uma heresia.
Uma arte diferente da Ocidental
Por isso, estrangeiros acostumados com artistas ocidentais renomados que assinam suas obras galerias tendem a generalizar. Ou seja, classificam depreciativamente como “artesanato” toda a produção artística “das Índias”embora se trate de uma arte cuidadosa, harmoniosa e rica em detalhes. Nesse caso, aliás, me refiro à Índia, e ao Nepal.

A temática
O artista indiano, porém não cria temas a seu bel-prazer; trabalha dentro de motivos tradicionais. Estes são sempre ligados à religião e obedece a normas transmitidas de geração em geração. Para melhor entender sua arte, o ideal, portanto, é encará-la dentro de seus respectivos conceitos religiosos. Ou seja, quase sempre, só artistas indianos de formação ocidental criam temas. Em outras palavras, para o artista indiano tradicional os temas já existem, caso, por exemplo das famosas pitchways. Cabe a ele caprichar cada vez mais, porém sem fugir do tema.

Krishna e Arjuna, um dos temas prediletos
As pinturas são feitas sobre algodão de diferentes texturas, sobre lâminas de mármore em relevos, sobre placas de marfim,. Ela têm como tema, sobretudo a vida do deus Krishna. Este é, às vezes retratado acompanhado de seu amigo Arjuna. Em outras pinturas o artista o representa junto com suas adoradoras em atitude de oferenda ou devoção. Normalmente, numa mesma tela o artista apresenta duas ou mais representações de Krishna. O artista também o retrata geralmente sobre uma flor de lótus, rodeado de animais sagrados, como a vaca e também o elefante.

Pinturas sobre algodão, marfim, madeira
As pinturas mais fáceis de serem compradas na Índia são as sobre tecidos, como algodão ou seda. São também as mais comuns. Mas, existem também trabalhos sobre placas de madeira, muito bonitos. Finalmente, temos ainda o marfim. Na Índia, os elefantes , utilizados nas aldeias como “tratores”, tem, aliás, suas presas, que podem ferir alguém, serradas. Esse marfim, é claro, é aproveitado. Os animais não são mortos para que suas presas sejam retiradas, como ocorre na África. Mesmo assim, nunca se tem certeza. Ou seja placas como essas, porém maiores, podem ser contrabandeadas da África e extraídas de animais mortos por traficantes. Por isso mesmo quase sempre compro minhas pinturas sobre placas de madeira que lembram muito o marfim. Em suma, sem incentivar o comércio criminosos do marfim.

Arte sobre lâminas de marfim ou de madeira

Em Jaipur casais de turistas entravam na loja, examinavam com interesse as peças mais erotizadas, trocavam um sorriso cúmplice. A maioria, porém, não tinha coragem de comprá-las. Afinal, algumas eram muito erotizadas para serem expostas numa sala de visitas. Por outro lado, algumas, consideradas apenas como sensuais atraiam mais compradores. Ou seja, apenas moças em poses sensuais.

Matar elefantes, nunca!
Música indiana
A música indiana se codificou nos antiquíssimos tratados conhecidos como Sastra. Trata-se de padrões musicais a serem seguidos. Estes são transmitidos através dos tempos pelos mestres ou gurus, que ensinam essa arte. Na Índia, a música apresenta noções, regras e conceitos mais amplos do que no Ocidente. Existem, dessa forma, o tempo — talam; as notas — svara; as gamas — grama, e ainda os rata — sequências relativas a todo um trecho de música. Esses antigos tratados abordam ainda o rasa — estados de alma provocados pelos ritmos musicais.

Os instrumentos musicais
Os instrumentos musicais — vadya — utilizados pelos indianos, são de três tipos. Ou seja, de percussão, corda e sopro. No primeiro está uma série de tambores de argila ou madeira, cobertos com pele de cabra ou carneiro, segundo a região. Alguns são utilizados apenas de um lado, como o tabl e o chenda, um pouco maior, batido com as mãos. Temos, igualmente, o maddalam, tocado com bastões de madeira e pendurado ao pescoço do músico. Outros instrumentos são peças metálicas, na forma de pequenos discos de poucos centímetros de espessura, que marcam assim o passo de certas danças religiosas.

Uma grande variedade, instrumentos de sopro, corda e percussão
Entre os instrumentos de sopro existem variedades de flautas, sendo as mais comuns a bansri, no norte, e a murali, no sul, que sempre aparecem em pinturas sobre a vida de Krishna, deus do amor.
Em algumas regiões do sul da Índia os músicos utilizam o nadhaswaram, de som grave, que lembra vagamente uma trombeta. Existe também e o chanku, um tipo de concha trabalhada para produzir alguns sons.

A cítara, popularizada por Ravi Shankar
Os ocidentais conhecem sobretudo a sítara. Foi principamente a arte de Ravi Shankar que popularizou a música indiana, depois de seu contato com os Beatles. O grupo britânico usou a cítara pela primeira vez em 1966, ao gravar a canção Tomorrow Never Knows. Sua letra é, em parte, tradução de trechos do Bardo Todol – o “Livro Tibetano dos Mortos”.
O músico indiano, por sua vez, ficou ainda mais conhecido por ser pai da cantora Norah Jones.


Explicação necessária:
Outras viagens pela Índia, lugares e experiências

Nosso destino nessa viagem de carro, espinha dorsal do livro “A Vaca na Estrada” de Paris ao Nepal, seria Katmandu. Da Europa passaríamos pela Turquia, Irã, Afeganistão, Paquistão e Índia. Antes, porém, de seguir para o Nepal fomos visitando outros lugares na Índia. Aliás, como estive diversas vezes no país, o livro “A Vaca na Estrada”, inclui igualmente algumas experiências vividas em outras viagens pelo subcontinente indiano.
Mumbay – Goa – Os marajás – o controle da natalidade – A arte na Índia – Rajastão 1 – “A Vaca na Estrada” – Rajastão 2 – Casamento à indiana – Viagem de trem na Índia – As castas – A colonização inglesa– Gandhi – Costumes, cultura – De Paris a Katmandu de carro – “A Vaca na Estrada” – Shiva e Jesus
