A troca de populações
Achachíd falou-nos de outros costumes da colonização inca. Assim, nos contou que sempre que desconfiavam da fidelidade do povo local, promoviamn a troca de populações. Ortiz franziu a testa.
– Trocas de populações?
– Para evitar rebeliões.
Achachíc explicou. Ou seja, para facilitar a assimilação dos povos dominados, parte de sua população era transferida para áreas no centro do império. Deviam se instalar, portanto, em regiões habitadas pelos quéchuas. Em suma, de modo que pudesse ser mais facilmente controlada. Da mesma forma, agricultores guerreiros incas instalavam-se entre as tribos submissas.
Os mitamaes
Esses colonizadores, chamados mitamaes, eram encarregados de vigiar as nações conquistadas. Da mesma forma deviam ensinar-lhe os costumes incas, sua língua e igualmente seus sistemas de irrigação e de construção, mais avançados. Os mitamaes controlavam também a execução das atividades compatíveis com cada estação do ano, que começava no auge do verão, em dezembro.
Encarregados de orgnizar os ayllus dentro dos padrões incas, os mitimaes, se algo não andasse bem, comunicavam o problema ao Tucuy Ricoc, o oficial do imperador, que passava periodicamente por suas aldeias. Qualquer falta era, portanto, punida. Achachíc que já fora, além de orejón, um Tucuy Ricoc, disse que essa era função reservada aos nobres mais leais.
As rebeliões de tribos dominadas
– E se resolvessem se rebelar? – perguntei.
O inca esboçou um sorriso:
– Bom… Houve certamente rebeliões… Mas soubemos lidar com elas. Ou seja, tínhamos melhores armas, mais variedade e, ainda mais, guerreiros bem treinados…
Achachic nos disse também que quando um povo não aceitava a rendição ou se rebelava, os quéchuas eram vingativos e cruéis. Os vencidos portanto eram taxados por pesados impostos e levados para Cusco como escravos. Em suma, designados, dessa forma para todos trabalhos pesados. O transporte, por exemplo, de enormes blocos de pedra utilizados nas construções incas.
Apesar de, geralmente não destruir as cidades do povo vencido, o Inca nela ingressava em sua liteira, cujos carregadores pisavam sobre os guerreiros derrotados, deitados no chão. O rei vencido era, aliás, exibido nu.
As crueldades na guerra civil entre Huácasr e Atahualpa
Ficamos um momento em silêncio. Intrigavam-me igualmente as crueldades cometidas contra os partidários de Huáscar durante a guerra entre os dois irmãos. O que Achachíc teria a dizer sobre isso?
– Essa foi uma guerra muito cruel… Não se tratou, entretanto, de mais uma pequena conquista. Atahualpa quis se vingar do irmão e, nos casos em que a resistência dos partidários de Huáscar foi muito feroz, seus guerreiros foram escravizados e as suas mulheres, entregues aos soldados quitenhos. Atahualpa quis inibir qualquer possibilidade de resistência dos cusquenhos.
Tomar Cusco para garantir a conquista
A estrondosa vitória obtida em Cajamarca aumentou assim a segurança de Pizarro que anunciou que pretendia tomar Cusco e, em suma garantir a conquista.
Conquista? A maioria dos soldados não estava interessada em conquistar mais nada. Sabíamos que em Cajamarca, principalmente naquela praça, os índios nunca nos atacariam. Mas como as coisas se passariam quando avançássemos entre vales e desfiladeiros? Apesar dos reforços trazidos por Almagro, éramos certamente muito poucos, se comparados à quantidade de guerreiros que teríamos que enfrentar. Em suma, duzentos e cinquenta espanhóis contra dezenas de milhares de índios. Pior, os nativos começavam igualmente a conhecer nossas táticas, como agíamos. Ainda mais, muito importante, era saber em que tipo de terrenos íramos livrar batalha. Poderíamos utilizar a cavalaria?
Dessa forma, Assustados, soldados que participaram da captura de Atahualpa julgavam que já tinham bastante ouro e falavam em voltar para a Espanha.
Por que arriscar?
Para que prosseguir e arriscar nossas vidas?, perguntavam os soldados. Já estamos suficientemente ricos. Queriam é voltar vivos pra desfrustar desse ouro!
Comentavam que nunca mais gostariam de passar pelo pavor que os assaltara ao marcharem de encontro às tropas de Atahualpa. Pablo era um deles. Seu pai morrera e lhe deixara uma pequena propriedade, que ele queria ampliar. Meu primo tinha alma de camponês, pensava na terra. Queria plantar na Andaluzia coisas do Peru, como batata, milho e abóbora. Eu mal podia acreditar. Com todo o ouro obtido em Nova Castela, ele queria plantar batatas!
– Não tem na Espanha, vou ficar ainda mais rico! Eu dei risada. Mas um dia reconheceria que era ele, afinal, quem tinha razão…
Voltar para casa só depois da tomada de Cusco
Eu sabia, porém, que Pizarro iria obrigar todo mundo a segui-lo até Cusco. Depois talvez liberasse os que desejavam partir. Expliquei isso a Pablo, que falou um palavrão e torceu o nariz.
– Inferno!
Procurei acalmá-lo. Tudo estava dando certo. Os índios sofreram uma derrota da qual nunca mais se esqueceriam. Pablo acabou por relaxar.
– E você? – perguntou ele. – O que pensa em fazer se Pizarro o liberar?
Eu sabia muito bem o que queria: mais ouro. Não queria voltar à Espanha para ser campônio. Pretendia viver de meu ouro, e para isso estava disposto a ficar mais tempo no Peru.
Quem tudo quer…
Depois voltou-se para mim.
– Cuidado, primo. Às vezes, quem tudo quer, tudo perde.
Não lhe dei atenção. Pablo era meio cagão. Conseguira um pouco de ouro e já queria sair correndo como um ladrãozinho que rouba uma galinha.
Pusemo-nos em marcha em 11 de agosto. Alguns de nós não conseguiam esconder a preocupação e chegaram a se confessar, temendo morrer em pecado. Um confissionário tosco foi montado para isso mesmo. Mas, acompanhando Ortiz, não me confessei.
O avanço rumo a Cusco
Os Curacas e o jovem imperador, que, de acordo com os costumes incas, viajava em sua liteira, acompanhado de todo um aparato e igualmente Pizarro com a cavalaria. O grosso da tropa, porém, seguia logo atrás. No final da fila, índios recrutados em Cajamarca, escravos africanos e nativos da Nicarágua transportavam o ouro e provisões.
A jornada transcorreu assim sem novidades,.à noite, porém, quando já estávamos acampados, chegaram notícias não muito boas. Ou seja, o irmão de Tupac Hualppa, enviado com uma dezena de guerreiros para verificar as condições das pontes que teríamos que atravessar, fora morto por quitenhos.
Avisei que não seria fácil
– Não disse que não seria assim tão fácil? – disse Pablo, apreensivo.
– Surgiram do nada e eram também numerosos. Só falta morrer agora com todo esse ouro que consegui ganhar.
Respirei fundo, já irritado. Meu primo me deixava nervoso.
– Não vamos morrer. Pare, portanto, com essa conversa!
Depois disso, durante dias a fio, ao contrário do que imaginávamos, os guerreiros de Quito, porém, mantiveram-se, distantes. Aproveitamos igualmente a excelente estrada inca para avançar muitas léguas por dia. Tensos, certamente, cruzávamos vales e colinas, sem saber se, repentinamente, uma multidão de guerreiros nos atacaria. Temeroso de alguma ofensiva indígena, Pizarro resolveu assim enviar cavaleiros e índios quéchuas, que conheciam bem a região, como batedores.
Huamachuco
No dia 17, um domingo, chegamos enfim a Huamachuco. Finalmente, uma cidade maior. Ou seja, quase do tamanho de Cajamarca, onde ficava um santuário religioso profanado por Atahualpa. Foi onde, aliás, o Inca assassinou seu sacerdote, após tratá-lo de mentiroso. Afinal, suas previsões nunca se concretizaram.
Nós, porém, fomos bem recebidos pelo povo e igualmente pelos curacas locais. Assim, depois de falar a Pizarro garantiram provisões para a tropa nos tambos da estrada para Cusco. Essas provisões seriam portanto de grande ajuda para nós, já cansados de frio e fome. Afinal, os tambos junto das estradas incas tinham não apenas comida, mas igualmente abrigo e mantas de lã de lhama perfeitas para o frio das alta serras. Nos vales, porém, era mais fácil, à cavalo caçar uma lhama e ter assim também alguma carne fresca. Ou seja, poder variar.
Siga a continuação desta postagem: A colonização inca
Como um analfabeto no comando de menos de duzentos homens, com pouca ou nenhuma experiência militar, conseguiu dominar um império de doze milhões de pessoas ?
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